domingo, 4 de maio de 2025
Crédito imobiliário com recursos de poupança cresce 16% no 1º trimestre
O volume de financiamentos com recursos das cadernetas do Sistema Brasileiro de
Poupança e Empréstimo (SBPE) chegou a R$ 38,3 bilhões no primeiro trimestre,
16,2% maior que o registrado no mesmo período do ano passado. Apenas em março,
eles somaram R$ 12,1 bilhões, 6,2% abaixo que no mesmo mês do ano passado.
Ante o mês de fevereiro de 2025, o volume é 5% menor. Os dados foram divulgados
hoje pela Abecip.
Nos últimos 12 meses foram financiados R$ 192 bilhões com recursos da
poupança SBPE, crescendo 31,7% em relação aos 12 meses precedentes.
Em números de unidades, foram financiados em março, nas modalidades de aquisição
e construção, 34,2 mil imóveis, 15% menor na comparação anual. Comparado a fevereiro
deste ano, houve redução de 5,6%. No 1º trimestre do ano, foram financiados 109 mil
imóveis com recursos da poupança SBPE, crescendo 10% em relação ao mesmo
trimestre do ano passado. Nos últimos 12 meses, foram financiados 578,1 mil imóveis
com recursos da poupança SBPE, crescendo 25,1% em relação aos 12 meses
imediatamente anteriores.
Em março, a poupança SBPE registrou captação líquida negativa em R$ 9,2 bilhões,
“confirmando a prevalência histórica da ocorrência de mais saques que depósitos para
o mês”, diz a Abecip. No primeiro trimestre, a captação líquida ficou negativa em
R$ 34,6 bilhões.
Reforma tributária e o setor imobiliário e de construção
Aprovada por meio da Emenda Constitucional 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar 214, sancionada em 16 de janeiro deste ano, a reforma tributária brasileira representa uma transformação significativa no sistema de tributação sobre o consumo.
O cronograma de implementação prevê o início dos testes de alíquota em 2026, a entrada em vigor da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em 2027 e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) em 2029. Este novo marco legal visa melhorar o ambiente de negócios, criar segurança jurídica e eliminar o contencioso tributário, representando uma resposta às complexidades do sistema tributário vigente.
O setor imobiliário e de construção, com suas características distintas e relevância socioeconômica, é diretamente impactado por essas mudanças. Suas particularidades, como os longos prazos de execução, a produção de bens essenciais como infraestrutura, saneamento e moradia, e seu significativo impacto na geração de empregos, sempre conferiram a este setor um tratamento tributário diferenciado. A análise aprofundada da reforma revela um esforço para considerar essas especificidades, embora ainda existam desafios e pontos a serem regulamentados.[1]
O cenário tributário atual do setor
Atualmente, a tributação sobre o consumo no setor imobiliário e de construção é complexa e multifacetada. Diversas atividades dentro do setor, como a locação, não sofrem a incidência de ICMS e ISS diretamente. A incorporação e o loteamento também não são diretamente tributados por esses impostos estaduais e municipais. A construção civil é, por sua vez, tributada principalmente pelo Imposto Sobre Serviços (ISS). Adicionalmente, a Contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) abrangem praticamente todas as atividades do setor.
Um ponto crucial é que, conforme destaca Rodrigo Dias, no regime tributário atual, os tributos pagos sobre os insumos adquiridos pelo setor imobiliário e de construção não geram crédito de ICMS para as empresas da construção civil e incorporadoras. Isso ocorre porque essas empresas, em geral, não são contribuintes de ICMS. Consequentemente, a carga tributária incidente sobre os insumos se incorpora ao custo dos bens e serviços, sendo repassada ao longo da cadeia produtiva até o consumidor final. Essa dinâmica faz com que o tributo seja encarado como um custo, influenciando a precificação dos produtos e serviços do setor.[2]
As inovações da reforma tributária para o setor
A principal mudança introduzida pela reforma tributária para o setor imobiliário e de construção é a substituição do emaranhado de tributos sobre o consumo pelo IBS e pela CBS. Essa unificação tributária visa simplificar o sistema e, principalmente, instituir um regime de não cumulatividade ampla.
O princípio da não cumulatividade assegura que o tributo incida apenas sobre o valor adicionado em cada etapa da cadeia produtiva, permitindo o aproveitamento integral dos créditos relativos aos tributos pagos nas etapas anteriores.
Essa é uma das mudanças mais significativas e benéficas da reforma para o setor, uma vez que os tributos pagos sobre os insumos poderão ser descontados do IBS e da CBS devidos nas operações de venda de imóveis e prestação de serviços de construção. Essa sistemática exigirá uma mudança de mentalidade das empresas, que passarão a dar maior importância à obtenção de créditos tributários em suas aquisições, buscando fornecedores que integrem o novo sistema.
Reconhecendo as particularidades do setor, a reforma estabelece um regime específico para as operações com bens imóveis, que engloba atividades como incorporação, loteamento, construção, administração e intermediação imobiliária (art. 262 e seguintes da LC 214/25).
Este regime prevê a aplicação de redutores de alíquota. De forma geral, as atividades do setor terão uma redução de 50% na alíquota padrão do IBS e da CBS (art. 261 da LC 214/25). A atividade de locação de imóveis terá um redutor ainda maior, de 70% (art. 261, § único, da LC 214/25). Além disso, o Regime Especial de Tributação (RET), conhecido no mercado imobiliário, será transformado, mantendo uma sistemática de tributação específica para a incorporação imobiliária.
Questões específicas e a necessidade de regulamentação
A implementação do IBS e da CBS trará impactos significativos para o setor imobiliário e de construção, que demandam regulamentação específica. Ao menos cinco temas podem ser desde já apontados.
O primeiro diz respeito ao momento de ocorrência do fato gerador em contratos de longo prazo. De acordo com o art. 254, V, da LC 214/25, o fato gerador do IBS e da CBS na prestação de serviços de construção civil ocorre no momento do fornecimento do serviço (art. 254, V, da LC 214/25). Em contratos de longa duração, contudo, é possível que surja dúvida em relação a que momento é este, uma vez que tais contratos podem envolver medições e aprovações de etapas. Assim, a definição precisa do momento do fornecimento é crucial seja para evitar controvérsias entre contribuinte e fisco seja para redigir com precisão os contratos do setor, tendo em vista a potencial repercussão do tributo no preço devido pela parte.[3]
Nesse sentido, vale lembrar que são diversos os contratos firmados no setor de construção, entre os quais destacam-se, a título ilustrativo, (i) o contrato de empreitada por preço global, em que se acorda um preço fixo e global para a execução da obra; (ii) o contrato de empreitada por preços unitários, em que se acorda que os preços são fixados para cada etapa de execução do contrato; (iii) o contrato de construção por administração, em que se acorda que o preço devido à construtora é uma porcentagem do valor total da obra; e (iv) o contrato por preço máximo garantido (PMG).
Largamente utilizada no setor nacional, essa última espécie contratual (PMG) não encontra previsão expressa na legislação brasileira, tendo sido introduzida como uma forma de incorporadoras reduzirem os riscos de produção, transferindo-os para as construtoras. Como apontado por Paulo R. Roque A. Khouri e Lucas Salim Vilela Pedras, “O contrato por PMG – Preço Máximo Garantido –, em linhas gerais, consiste na contratação de uma empresa para a execução de uma obra, com base em um orçamento e um prazo previamente definidos.
Caso o preço máximo seja atingido, responsabiliza-se aquela pelo valor excedente; e, na hipótese de o custo ficar abaixo, lhe é conferido um bônus pelo dono da obra.”[4] Nesse tipo de contrato, a inclusão dos tributos no preço total reflete o fato de esses serem considerados custos. Com a reforma tributária, contudo, surge dúvida acerca de como proceder a tal inclusão.
Isso porque, diante da celebração de contratos plurianuais, não é claro, de acordo com a LC 214/25, em que momento se reputará ocorrido o fato gerador do IBS e da CBS e, consequentemente, o momento que deverá ser feita a inclusão dos valores a ele atinentes no custo para a execução da obra.
Mais especificamente, é possível vislumbrar ao menos três interpretações possíveis quanto ao momento de ocorrência do fato gerador na hipótese de contratos plurianuais de execução de obra: (i) primeiro, o fato gerador ocorre na celebração do contrato de execução da obra, (ii) segundo, o fato gerador ocorre ao longo das etapas de recebimento do preço pela execução da obra, e (iii) terceiro, o fato gerador ocorre na conclusão do contrato de execução da obra.
O art. 10 da LC 214/25 parece privilegiar a terceira alternativa, ao sugerir que “considera-se ocorrido o fato gerador do IBS e da CBS no momento do fornecimento as operações com bens ou com serviços, ainda que de execução continuada ou fracionada” e o § 1º, inciso III, do mesmo dispositivo prescreve que “para fins do disposto no caput deste artigo, considera-se ocorrido o fornecimento no momento: (...) do término do fornecimento, no caso dos demais serviços”. De igual modo, essa conclusão parece encontrar suporte no art. 254, V, da LC 214/25 que estabelece que “considera-se ocorrido o fato gerador do IBS e da CBS: (...) no serviço de construção civil, no momento de fornecimento”.
Ainda assim, é desejável que o tema seja objeto de regulação detalhada e explícita, que esclareça o momento de ocorrência do fato gerador na hipótese de contratos plurianuais. Trata-se de questão de suma relevância, entre outras razões, porque a própria definição da alíquota aplicável à operação depende dessa determinação. Com efeito, a definição da alíquota aplicável em contratos de longo prazo, se a vigente (i) no início, (ii) durante as etapas de recebimento (em caso de adiantamentos, por exemplo), ou (iii) no final do contrato é questão crucial para as operações realizadas rotineiramente no setor.
O segundo tema que merece regulamentação diz respeito ao creditamento no setor. Embora o novo sistema permita o ressarcimento de créditos de IBS e CBS independentemente de o pagamento ter sido efetuado pelo cliente, a falta de aprovação do orçamento geral da União pode gerar um descasamento entre o pagamento dos novos tributos e a compensação dos créditos acumulados.
Como a reforma sobre o consumo foi desenhada para incentivar o investimento e a exportação, permitindo que empresas acumulem créditos durante a fase de investimento e solicitem sua devolução em prazos definidos, uma medida importante para o setor é justamente a adoção de um mecanismo que transforme o ISS e o ICMS pagos atualmente em créditos de IBS. Tal medida teria como efeito desonerar a cadeia produtiva e mitigar os impactos tributários em atividades de longo prazo.[5]
O terceiro tema digno de regulamentação específica concerne a tributação dos consórcios. O § 2º do art. 3º da LC 214/25 estabelece que “incluem-se no conceito de fornecedor de que trata o inciso III do caput deste artigo as entidades sem personalidade jurídica, incluindo sociedade em comum, sociedade em conta de participação, consórcio, condomínio e fundo de investimento”. Ademais, as operações de administração e intermediação de consórcios são consideradas serviços financeiros, nos termos do art. 206 da LC 214/25, sujeitando-se, portanto, ao IBS e à CBS.
A própria LC 214/25, contudo, parece ter criado exceções a essas incidências no tocante às aquisições de bem imóvel feitas por consorciados. Conforme o § 2º do artigo 204 da LC 214/25, “As aquisições de bens e de serviços por consorciado com carta de crédito de consórcio ficam sujeitas às regras previstas nas normas gerais de incidência de que trata o Título I deste Livro, exceto no caso de bem imóvel, que fica sujeito ao respectivo regime específico, e de outros bens ou serviços sujeitos a regime diferenciado ou específico, nos termos desta Lei Complementar, não havendo responsabilidade da administradora do consórcio por esses tributos.”
Diante desse cenário, a forma como os créditos serão apropriados e utilizados por empresas consorciadas, especialmente aquelas com estruturas centrais que realizam diversas atividades de suporte aos consórcios, necessita regulamentação clara. Uma alternativa possível que poderia ser adotada por eventual regulamento é ser consórcio tratado como um ente centralizador de débitos e créditos, com o saldo a pagar sendo rateado entre as empresas consorciadas, o que tenderia a facilitar a operacionalização e a compensação com os créditos próprios de cada empresa.[6]
O quarto tema que deve ser objeto de regulamentação específica concerne a compra e venda de imóveis. A tributação sob o novo sistema envolve a aplicação de redutores sobre a base de cálculo, nos termos do art. 257 da LC 214/25 e seguintes. Conforme o § 1º do mesmo dispositivo, o redutor de ajuste será utilizado exclusivamente para reduzir a base de cálculo das operações de alienação de bem imóvel realizadas por contribuinte do regime regular do IBS e da CBS. Entre outras coisas, tal redutor visa retirar da tributação valores não consumíveis, como é o caso do terreno e das parcelas já tributadas em operações anteriores.
A LC 214/25 previu ainda um redutor social. Conforme o art. 259 da LC 214/25, “Na alienação de bem imóvel residencial novo ou de lote residencial realizada por contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS, poderá ser deduzido da base de cálculo do IBS e da CBS redutor social no valor de R$ 100.000 por imóvel residencial novo e de R$ 30.000 por lote residencial, até o limite do valor da base de cálculo, após a dedução do redutor de ajuste.”
Caberá, assim, à regulamentação detalhar a aplicação de tais redutores, justamente para que não haja dúvidas quanto às hipóteses de seu cabimento e ao seu modo de aplicação.
E, finalmente, um quinto tema que merece atenção em eventual regulamento é o tratamento tributário do parque de máquinas já existente nas empresas de construção civil, uma vez que os tributos pagos na aquisição desses ativos, sob o regime cumulativo da Contribuição ao PIS e da Cofins, não geram créditos que possam ser aproveitados no novo sistema. A questão carece solução definitiva, mormente diante da possibilidade de depreciação futura gerar créditos de CBS/IBS, alinhando-se ao tratamento dado a empresas no regime de lucro real.[7]
Considerações finais e perspectivas
A transição para o novo sistema tributário, que se estenderá por dez anos, demandará um esforço de adaptação significativo por parte do setor imobiliário e de construção. A regulamentação será fundamental para detalhar os aspectos operacionais da reforma e garantir que as peculiaridades do setor sejam devidamente consideradas, evitando distorções e insegurança jurídica. A abertura de um canal para o recebimento de sugestões para a regulamentação é um passo importante para garantir que o setor participe ativamente na construção das normas complementares.
As perspectivas futuras para o setor sob o novo regime tributário são promissoras. A instituição da não cumulatividade e a possibilidade de creditamento tendem a desonerar a atividade produtiva e incentivar o investimento. A irrelevância da alíquota no meio da cadeia para as empresas contribuintes do IBS e da CBS representa uma mudança estrutural importante.
A trava constitucional de dez anos que impede o aumento da carga tributária global é uma garantia adicional para o setor. A expectativa é que, com os ajustes necessários e uma regulamentação bem elaborada, a reforma tributária possa contribuir para um ambiente de negócios mais eficiente e competitivo para o setor imobiliário e de construção no Brasil.
Como indiquei no passado, a EC 132 procurou romper com a crise de legitimidade da atual tributação sobre o consumo (ISS, ICMS, IPI e Contribuição ao PIS e Cofins) mediante a institucionalização da simplicidade e da transparência como princípios-estruturantes (art. 145 § 3º) do Sistema Tributário Nacional.[8] As regras fundantes do IBS e da CBS, institucionalizadas nos artigos 149-B, 156-A e 156-B da EC 132, e agora fixadas pela LC 214/25 devem ser entendidas e aplicadas à luz desses princípios.
Assim, apesar dos desafios iniciais e da necessidade de adaptação, o consenso entre os especialistas é que a reforma, em sua essência, foi concebida para beneficiar o setor produtivo, eliminando resíduos tributários e simplificando um sistema que, há muito, demandava modernização.
domingo, 27 de abril de 2025
Expansão habitacional avança no Brasil, mas déficit persiste e pressiona políticas públicas
Essa multiplicação de moradias se deu, em parte, pela queda da taxa Selic a partir de 2019, que impulsionou o crédito imobiliário e favoreceu a construção, mesmo com a posterior alta dos juros. “O dinamismo permaneceu graças a políticas públicas, à ampliação dos mercados de capital e a reformas microeconômicas de longo prazo”, afirma um especialista do setor. Um exemplo citado é a criação do patrimônio de afetação, em 2004, que trouxe maior segurança ao financiamento imobiliário privado.
Em 2024, o mercado seguiu aquecido: 1,2 milhão de moradias foram financiadas e 400 mil novas unidades verticais vendidas, incluindo empreendimentos do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV). As unidades de médio e alto padrão também mostraram força, com alta de 20% nos lançamentos e 5% nas vendas, puxadas principalmente pelo segmento de alto padrão, que ajudou a elevar em mais de 20% o valor total comercializado.
A expansão se sustenta ainda no crescimento do emprego formal, que fortaleceu o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Em 2024, mais de R$0,5 trilhão foi emprestado a compradores, com destaque para as faixas de baixa renda do MCMV. Desde 2023, aproximadamente 1,4 milhão de contratos foram firmados entre construtoras e compradores sob esse programa. “O MCMV passou a incorporar critérios de acesso a serviços urbanos para facilitar o crédito mais barato”, explica um técnico envolvido com o programa.
Além disso, instrumentos financeiros como LCI, CRI e LIG ajudaram a irrigar o setor com R$742 bilhões até o final de 2024. O resultado foi uma queda histórica na inadimplência, que chegou a apenas 1%, o menor nível desde 2006.
Entretanto, o acesso ao financiamento ainda é limitado: apenas 12,5% dos proprietários têm hipotecas, frente a mais de 60% nos Estados Unidos. O déficit habitacional permanece estacionado em 6 milhões de moradias, e a população em favelas saltou 40% desde 2010, alcançando 16,4 milhões de brasileiros. Apesar de melhorias no acesso ao saneamento, as favelas ainda concentram apenas 3% das escolas e 1% dos estabelecimentos de saúde do país, embora abriguem 8% da população.
Outro fator de destaque é a mudança no perfil dos domicílios. O número médio de moradores por residência caiu de 3,7, em 2000, para 2,8, em 2022. Já as unidades habitadas por apenas uma pessoa passaram de 12% em 2010 para 19% em 2022 — um aumento de 6 milhões de lares. “Quase 30% dos idosos já vivem sozinhos”, destaca uma demógrafa.
A presença de mulheres como chefes de família também cresceu, passando de 39% para 49% em uma década, enquanto lares com dois cônjuges caíram de 65% para 57%. Apesar da redução da população de 0 a 25 anos, o grupo entre 25 e 39 anos — principal força de demanda habitacional — se manteve estável, o que ajuda a sustentar o ritmo de crescimento.
A locação também se expandiu: 27% dos brasileiros agora vivem em imóveis alugados. Entre famílias monoparentais com filhos pequenos, a proporção de moradores de aluguel é 70% maior do que a média nacional. “Esses grupos, geralmente de menor renda, mantêm o componente de déficit habitacional relacionado ao alto comprometimento da renda com aluguel”, apontam especialistas do setor.
Olhando adiante, o país tenta diversificar as fontes de financiamento, inclusive com recursos oriundos da exploração do petróleo, além de buscar mão de obra mais qualificada para atender à demanda. Ao mesmo tempo, questões estruturais emergem com força: 11 milhões de imóveis estavam vagos em 2022, e o espraiamento urbano, especialmente em cidades médias, levanta preocupações sobre mobilidade e eficiência dos transportes. O uso crescente de aplicativos, que tem esvaziado o transporte coletivo, também entra nesse debate.
“Os contrastes de um Brasil que mudou rapidamente exigem novas respostas em políticas públicas”, conclui um urbanista. Em um país com tantos desafios, a moradia continua no centro das transformações sociais, econômicas e urbanas.
O novo plano do governo pode mudar o rumo do mercado imobiliário no Brasil
Com o setor da construção civil enfrentando uma de suas piores crises, o governo brasileiro decidiu apostar alto: atrair investidores estrangeiros com a promessa de residência permanente. A estratégia, porém, levanta dúvidas sobre seus efeitos reais no acesso à moradia e na integridade do mercado imobiliário.
Um “visto dourado” à brasileira
O governo Lula oficializou uma iniciativa que já existia, mas era pouco conhecida: o visto de residência permanente para estrangeiros que invistam no setor imobiliário. Para garantir o benefício, é necessário aplicar R$ 1 milhão nas regiões Sul, Sudeste ou Centro-Oeste, ou R$ 700 mil no Norte e Nordeste. Em quatro anos, o investidor pode solicitar a cidadania brasileira.
Embora essa regra exista desde 2018, menos de 800 vistos foram concedidos até hoje. Com a crise no setor, provocada pelos altos juros e pela estagnação da demanda, o governo acredita que o incentivo poderá injetar até R$ 1 bilhão já no primeiro ano. Para promover a iniciativa, está previsto o evento CIMI360, em São Paulo, que pretende apresentar o mercado imobiliário brasileiro a investidores internacionais.
As experiências negativas em outros países
O modelo não é novo. Países como Portugal, Espanha e Chipre já adotaram estratégias semelhantes — e enfrentaram sérias consequências. Em Portugal, por exemplo, o boom de investidores estrangeiros encareceu os aluguéis e reduziu drasticamente a oferta de moradias para a população local, a ponto de o governo excluir imóveis do programa em 2023.
Além da pressão sobre o mercado habitacional, também surgiram casos de uso indevido do visto por oligarcas e criminosos, além da sobrecarga em serviços públicos como a saúde. Especialistas temem que o Brasil possa repetir esse cenário, especialmente devido ao histórico de lavagem de dinheiro no setor imobiliário, sobretudo por grupos mafiosos estrangeiros.
Oferta em excesso e crise habitacional
Diferente da Europa, o Brasil enfrenta um paradoxo: há um enorme déficit habitacional — estimado em 5,8 milhões de moradias — ao mesmo tempo em que sobram imóveis nas grandes cidades. Isso ocorre porque a construção de novos empreendimentos nos últimos anos não foi acompanhada por um crescimento real da demanda.
Enquanto cerca de 25 milhões de brasileiros vivem em moradias precárias, como favelas e ocupações irregulares, muitos apartamentos novos seguem vazios. Mais de 70% das famílias de baixa renda comprometem mais de 30% dos ganhos mensais com aluguel, agravando ainda mais o problema.
Suspeitas, fraudes e investigações
A situação se complica com denúncias de fraudes envolvendo empresas que receberam subsídios públicos para construir moradias populares em São Paulo. Segundo o portal UOL, construtoras teriam desviado o foco dos projetos para atender públicos de maior poder aquisitivo, com imóveis avaliados em até R$ 20 mil por metro quadrado.
O Ministério Público já investiga mais de 1.200 possíveis fraudes, com a participação de nove das dez maiores construtoras da capital paulista. Além disso, o número de leilões de imóveis quintuplicou em dois anos, reflexo do aumento da inadimplência entre os compradores.
Um cenário econômico delicado
O governo vê no visto de investimento uma tentativa de amenizar a crise econômica. O Banco Central reduziu a previsão de crescimento do PIB para 1,9% em 2025. Além disso, o déficit da conta corrente atingiu US$ 17,3 bilhões nos dois primeiros meses do ano — o pior resultado desde 2015.
Apesar do aumento das importações ter contribuído para esse cenário, também houve crescimento nos investimentos estrangeiros diretos. Ainda assim, há receios sobre a eficácia do visto para reverter o momento atual, marcado por insegurança jurídica, violência urbana e alto custo da saúde privada.
O governo aposta também no mercado interno
Diante das dificuldades, o governo decidiu ampliar o alcance do programa “Minha Casa, Minha Vida”. Agora, famílias com renda entre R$ 8 mil e R$ 12 mil também podem participar, adquirindo imóveis de até R$ 500 mil. A medida tenta estimular o consumo interno e aliviar a pressão sobre as construtoras.
Se o visto dourado será um alívio ou um agravante para o mercado imobiliário, ainda é cedo para dizer. Mas uma coisa é certa: o Brasil está apostando alto para enfrentar uma crise que, por enquanto, segue sem solução fácil.
BC estuda novas fontes de recursos para crédito imobiliário
O diretor de regulação do Banco Central (BC), Gilneu Vivan, afirmou que existe uma discussão sobre o modelo de funding (fontes de recursos) do crédito imobiliário. Vivan participou de coletiva sobre a agenda regulatória do BC para 2025 e 2026. O estudo de alternativas e melhorias no processo de concessão e fontes de financiamento do crédito imobiliário entrou na lista de prioridades do BC.
Vivan pontuou que há um debate também sobre as características que os contratos imobiliários devem ter em um ambiente de funding mais volátil. “Por exemplo, hoje você tem um funding de poupança. A poupança se você olhar o estoque é um valor muito estável e, ao longo do tempo, o banco tem certa segurança de que aquele valor vai existir durante todo o contrato. Quando passa a discutir outros tipos de funding, você passa a ter outros tipos de risco”, disse.
O diretor apontou, por exemplo, que se for trabalhar com Letra de Crédito Imobiliário (LCI) haverá variação de preço e de oferta. “Isso vai afetar também o risco, porque se passa a assumir um risco de descasamento e a discussão é como isso vai formar o preço do crédito imobiliário. Então, que tipos de características a gente deve incorporar na gestão de risco, no contrato, para que seja mitigado esse tipo de risco e se possa manter a oferta de crédito imobiliário”.
Vivan destacou que não há, no momento, nenhuma solução que o BC acredita que seja viável e que o debate está aberto. “Pode ser uma solução, entre aspas, rápida, se aparecer alguma boa alternativa, ou a gente pode estender a conversa pela necessidade de achar um modelo que efetivamente se sustente no tempo”, disse.
domingo, 20 de abril de 2025
Reforma Tributária deve beneficiar setor imobiliário, afirma Ministério da Fazenda
“Ao contrário do que sugerem as notícias infundadas, não haverá aumento relevante de custos. Pelo contrário, a tributação atual será reduzida”, afirma a pasta.
Segundo o governo, vendas ocasionais de imóveis por pessoas físicas continuarão isentas de impostos. Já nas vendas feitas por incorporadoras, o novo modelo trará vantagens significativas
- A tributação incidirá somente sobre a diferença entre o valor da venda e o custo do terreno;
- Será aplicado um redutor de R$ 100 mil na base de cálculo, beneficiando os imóveis populares;
- A alíquota será reduzida pela metade (cerca de 14%, considerando uma alíquota padrão de 28%);
Haverá compensação integral dos impostos pagos na compra de materiais e serviços, o que não ocorre hoje.
Com essas mudanças, estima-se que o custo de um imóvel novo popular (R$ 200 mil) caia em 5,5%, enquanto o de um imóvel de alto padrão (R$ 2 milhões) suba apenas 2,3%. Porém, ganhos de eficiência com a possibilidade de recuperação de créditos poderão reduzir ainda mais os preços.
No caso de empresas dedicadas à compra e venda de imóveis, o imposto incidirá apenas sobre a margem de lucro, com alíquota reduzida e possibilidade de compensar despesas operacionais.
Para locações, a tributação não muda para pessoas físicas. Já para empresas, haverá uma alíquota reduzida de 8,4%, com dedução de R$ 600 mensais na base de cálculo e plena não-cumulatividade, o que elimina custos indiretos.
O governo reforça que haverá uma transição específica para o setor e que a reforma trará justiça tributária: “A proposta tributará menos os imóveis populares do que os de alto padrão”.