sexta-feira, 17 de abril de 2020

Não é vergonha ir para a renda fixa’, diz presidente do Bradesco



Em live da Ágora Investimentos nesta quinta-feira, 16, o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari, comentou os impactos do coronavírus na economia e no banco. Na conversa, mediada pela analista Ellen Steter, o executivo falou sobre as soluções que vêm sendo adotadas para ajudar empresários em dificuldades.
Para o investidor que, sem a orientação necessária, transferiu seu dinheiro da renda fixa para a renda variável e se surpreendeu com as perdas, ele lembrou que é importante se aconselhar com um especialista. E deu um recado. “Não é vergonha nenhuma ir para a renda fixa, ela também é um bom investimento. Não devemos colocar todos os ovos na mesma cesta.”

Ágora – O senhor já se expressou em outras entrevistas sobre a crise como presidente do Bradesco. Agora a pergunta é diferente: como o cidadão Octavio está enxergando o momento que estamos atravessando?
Octavio de Lazari – Temos que viver um dia de cada vez. Pode parecer banal, mas perdemos essa essência de viver o presente. Hoje tivemos uma mudança profunda no nosso jeito de ser e modo de agir e pensar. Estamos cuidando do presente, da saúde dos nossos funcionários, do dia de hoje.
A história da humanidade foi marcada por mudanças que foram detonadas por um gatilho que mudou o comportamento das pessoas: as quatro Revoluções Industriais, as duas Guerras Mundiais. Eu me questiono se essa quarta revolução industrial, a do conhecimento, não está sendo desafiada por um inimigo invisível com o qual não sabemos lidar. E que nos faz voltar para o mais essencial, que é cumprir com a missão de sobreviver. Isso tem que trazer reflexões para nós.

Se hoje temos cadeias globais de fornecimento, não existem mais fronteiras para os países produzirem e venderem o que tiverem de melhor, o Brasil produz insumos, grãos e minérios… tudo isso acabou no momento em, que por alguns tostões, você desvia uma carga de máscaras, testes e equipamentos.
Temos que repensar nosso planeta. O quanto estamos fazendo por ele de fato? O planeta está nos dando uma chance de repensar nossa atitude como seres humanos. Temos mudar nosso modo de agir para poder deixar para as próximas gerações um outro estilo de vida, outro modo de consumo. Em que possamos procurar a nossa felicidade sem o exagero de consumo de recursos naturais que temos hoje.

Ágora – Como economista, como você enxerga a economia brasileira diante desses novos desafios propostos? Como vamos virar a página?
Octavio de Lazari – Difícil falar agora, pois ainda não temos clareza de quanto tempo esse problema irá se estender. Os reflexos certamente serão sérios. Temos que procurar fazer o nosso melhor e viver um dia de cada vez. Teremos reflexos importantes no PIB, estimo queda próxima a 4%, mas é quase um achismo.

Temos que ter uma postura de respeito aos contratos, as pessoas têm que cumprir suas obrigações. Vejo oportunistas dizendo: não vamos mais pagar contas, aluguéis… não podemos fazer isso! Quando alguém deixa de pagar, alguém deixa de receber, e esse outro alguém deixa de ter condições de pagar seus empregados, fornecedores.
Quem puder pagar, pague, assim a roda da economia continuará girando, ainda que mais lentamente, com algum solavanco. Esses ativismos só destroem a população como um todo. Quem não puder pagar, procure seu credor e renegocie sua dívida, para tentar esticar o prazo, pagar um pouco menor, replanejar a situação financeira. O momento é de pensar na comunidade e agir com extrema responsabilidade.
Ágora – Vimos medidas do governo para tentar mitigar os impactos do coronavírus na economia. Como o banco tem se posicionado para auxiliar nessa travessia?
Octavio de Lazari – Nunca havíamos visto os três maiores bancos privados se unirem por uma mesma causa. Bradesco, Itaú e Santander se juntaram e procuraram o Ministério da Saúde para oferecer ajuda. O Ministério disse: não adianta oferecerem dinheiro, nós até temos dinheiro. O que precisamos é que usem de seu networking para ajudar a trazer os equipamentos de que precisamos.

Então compramos 5 milhões de testes, estamos doando 30 tomógrafos da Siemens, fizemos a doação de outros equipamentos, doamos R$ 50 milhões para uma entidade que arrebanhou empresários individuais para produzir máscaras. Estamos contribuindo com um hospital de campanha do Rio de Janeiro, doamos 80 mil cestas básicas em São Paulo. Cada um está buscando se solidarizar e ajudar.
É importante que o desejo de solidariedade da sociedade não venha apenas nesse momento, mas que seja estruturante, uma ação contínua. O poder público não vai resolver todos os problemas sozinho.
Ágora – E o lado dos empresários? Ele se mostra fragilizado. O cenário é desafiador.
Octavio de Lazari – Enquanto em 2008, a crise tinha a ver com o próprio setor financeiro, hoje os bancos são parte importante da solução do problema. Fomos conversar com o Banco Central e o BNDES, perguntar o que poderíamos fazer por aquelas empresas que geram mais empregos e têm uma estrutura de capital mais fragilizada, que faturam de R$ 360 mil a R$ 10 milhões. Nós temos que fazer a folha de pagamento dessas empresas para que elas continuem produzindo, ainda que em escala menor.

Surgiu a ideia de fazermos a folha dessas empresas por dois meses, abril e maio. Rapidamente os bancos selecionaram essas empresas. A gente aprovou 92% das empresas que têm folha de pagamento no Bradesco, são 54 mil empresas que envolvem 1,4 milhão de trabalhadores. Oito mil empresas já tomaram esse crédito e o dinheiro já foi direto para a conta das pessoas, que precisam se alimentar e pagar suas obrigações. Nas folhas de pagamento não tem spread, estamos usando toda a rede de distribuição, suportando os custos operacionais, não estamos cobrando nada por isso, os bancos não vão ganhar um centavo com a operação.
Uma outra medida foi prorrogar as parcelas por 60 dias, mantendo exatamente a mesma taxa de juros do contrato. Não há elevação de taxa, ao contrário do que algumas pessoas vêm dizendo. Todas as operações em que nossos clientes pedirem para jogar as parcelas de abril e maio para o final do contrato, a taxa de juros será a mesma. O que vai acontecer é que a prestação vai aumentar um valor pequenininho, porque o prazo do contrato vai aumentar dois meses.

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