terça-feira, 11 de outubro de 2022

Nova lei reduz burocracia e riscos na compra de imóveis

 



Uma nova lei reduziu o risco de quem compra um imóvel de ter que responder por dívida do antigo proprietário, se a pendência não estiver registrada na matrícula do bem. O adquirente não precisa mais fazer aquela espécie de auditoria sobre a vida do vendedor, que exigia a retirada de ao menos dez certidões negativas - nas esferas federal, estadual, criminal, fiscal, trabalhista e de família.

 

Editada recentemente, a Lei nº 14.382 só continua exigindo a documentação sobre o pagamento dos impostos: IPTU, ITBI (compra) e ITCMD (doação). Também a certidão de matrícula, que demonstra se o imóvel tem algum registro de hipoteca, alienação fiduciária ou penhora.

 

Ao alterar o artigo 54 da Lei nº 7.433, de 1985, a nova norma pode evitar discussões judiciais entre credores dos antigos proprietários do imóvel e o atual dono. “A nova lei, além de diminuir a burocracia e gastos com a compra de imóveis, dá mais segurança de que o comprador não poderá ser responsabilizado por dívidas de terceiros, caso não exista registro na matrícula sobre a dívida existente do vendedor”, afirma Kelly Durazzo, do Durazzo & Medeiros Advogados.

 

O comprador pode chegar a economizar em torno de R$ 700, em São Paulo e no Rio de Janeiro, por CPF pesquisado, com despesas e a contratação de despachante para a retirada de certidões negativas. Para a advogada, “essa lei colocou uma pá de cal sobre o assunto”, que vinha sendo discutido há anos no Judiciário.

 

Segundo o advogado Bruno Sigaud, do Sigaud Advogados, a nova lei, em linhas gerais, reforça a proteção ao terceiro de boa-fé. Ele aponta que a jurisprudência majoritária no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) destacava, até então, a necessidade das certidões negativas. “Agora, com a nova legislação, essas certidões deixam de ser indispensáveis para a aquisição do bem”, diz.

 

Mas Sigaud pondera que o escritório ainda recomenda a emissão das certidões. “Continua sendo relevante para evitar qualquer questionamento futuro”, afirma. Ele lembra que várias das certidões podem ser emitidas gratuitamente pelos sites dos tribunais, como o do TJSP.

Mesmo após a entrada em vigor da nova norma, ainda é praxe no mercado, segundo advogados da área, a exigência de todas as certidões. Até agora, também não se sabe de decisão judicial que mencione ou determine a aplicação da nova lei. Por isso, na opinião do advogado Luís Rodrigo Almeida, sócio do Dib Almeida Laguna Manssur, é preciso ter cautela até se saber como o Judiciário vai se comportar.

 

Para Almeida, a nova norma transfere ao credor a obrigação de registrar ações judiciais ou cobranças na matrícula do imóvel do devedor. “Contudo, a Justiça ainda traz obstáculos para esses registros, em alguns casos”, diz. Isso acontece quando, por exemplo, a ação judicial que pode resultar em cobrança ainda está no início, “o que pode trazer problemas aos compradores”.

 

Mesmo que a nova lei seja bem recebida pela Justiça e os juízes realmente deixem de exigir esses documentos para comprovar que o comprador teve cautela e boa-fé ao adquirir o imóvel, ele afirma que, nos casos de empreendimentos imobiliários, seria melhor manter a diligência. “O impacto nesses casos seria gigantesco, uma vez que envolvem diversos terceiros, que compraram unidades no empreendimento e podem ficar em risco.”

 

A discussão sobre a proteção de compradores de imóveis de boa-fé, para que não sejam depois cobrados por credores de antigos proprietários, tem um longo histórico no Judiciário. Em 2009, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a Súmula 375 que dizia que “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

 

Apesar da súmula, surgiu no mercado uma nova dúvida por causa da sua redação. Começou a ser travada uma nova discussão sobre quem seria o responsável por produzir essas provas.

 

Uma corrente entendia que o ônus de comprovar a não ocorrência da má-fé seria do comprador. Contudo, em dezembro de 2014, o entendimento foi pacificado pelo STJ, no julgamento de um recurso repetitivo (REsp 956.943). Nele, prevaleceu o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, de que “inexistindo registro da penhora na matrícula do imóvel, é do credor o ônus da prova de que o terceiro adquirente tinha conhecimento de demanda capaz de levar o alienante à insolvência”.

 

Depois disso, em 2015, a Lei nº 13.097 adotou o entendimento do STJ. Deixou claro, no artigo 54, que essas pendências sobre o imóvel devem constar na sua matrícula. Também estabeleceu que o comprador de imóvel de boa-fé não poderá ser responsabilizado, caso não haja ressalva naquele documento.

 

“A partir dessa publicação, o Judiciário começou a criar jurisprudência não aceitando a hipótese de fraude, caso a dívida não constasse da matrícula”, diz a advogada Kelly Durazzo. Contudo, ainda assim, alguns tribunais continuavam entendendo que a praxe do setor era pedir as certidões e, quando isso não acontecia, segundo ela, entendiam caracterizada a má-fé.

 

Agora, com a Lei nº 14.382, de 2022, houve a inclusão do parágrafo 2º nesse mesmo artigo 54, o que poderá encerrar a discussão, conforme especialistas, ao dispensar expressamente a exigência das certidões.

Nenhum comentário:

Postar um comentário