Para ampliar o crédito imobiliário, promessa do ministro da Fazenda Fernando Haddad, o governo trabalha em pelo menos duas frentes. As medidas têm potencial para injetar no mercado R$ 300 bilhões, segundo técnicos a par das discussões.
Uma das frentes em discussão envolve a redução do compulsório da caderneta de poupança, que é o dinheiro que precisa ficar depositado no Banco Central (BC) sem poder ser usado pelas instituições financeiras. O objetivo é destinar o recurso liberado para o financiamento da moradia.
Hoje, os bancos precisam reservar 20% de todos os recursos depositados na poupança no BC. Esse dinheiro é remunerado e o objetivo é garantir a segurança do sistema financeiro. Ao mesmo tempo, os bancos precisam destinar 65% do total da poupança para financiar a casa própria. Isso não muda para quem guarda dinheiro na tradicional caderneta, mas o montante depositado é fundamental para o financiamento imobiliário.
A ideia é reduzir o compulsório de 20% para 15%, direcionando essa folga para ampliar de 65% para 70% o direcionamento da caderneta de poupança para operações de financiamento imobiliário dentro do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Hoje, são R$ 730 bilhões nessa modalidade de crédito.
Mercados secundário de crédito
A outra frente de medida envolve uma ideia de Haddad de fazer deslanchar a compra e venda de carteira de crédito imobiliário dos bancos.
Além de liberar uma parcela do compulsório, o plano é fazer com que aconteça no mercado imobiliário o que já ocorre com empréstimo consignado, financiamento de veículos e venda de fatura do cartão de crédito: os bancos vendem suas carteiras no mercado. O plano é deslanchar o mercado secundário para a modalidade de financiamento habitacional.
Hoje, um banco fica por mais de 20 anos carregando o financiamento imobiliário (que é o prazo dos financiamentos). Isso, por exemplo, trava o balanço e impede ampliar financiamento em muitos casos porque há limites prudenciais para empréstimos.
A ideia de Haddad é viabilizar a compra e venda de carteira, capitalizando bancos e liberando espaço no balanço. Isso não muda para quem já tem o financiamento.
Taxa de equalização
Atualmente, os contratos são corrigidos pela Taxa Referencial (TR), enquanto a troca de balcão (ou seja, a venda da carteira) ocorre principalmente usando o IPCA. O governo trabalha num mecanismo para corrigir essa distorção que não envolva recursos do Tesouro Nacional.
O plano do governo é aproveitar a trajetória de queda da Taxa Selic, hoje em 10,75% ao ano, e preparar o terreno para deslanchar o mercado secundário do crédito imobiliário em 2025. Neste sentido, o governo vai mudar o papel da Empresa Gestora de Ativos (Emgea), criada em 2001 e que herdou contratos habitacionais da Caixa Econômica Federal com problemas de inadimplência, numa iniciativa para limpar o balanço do banco à época.
Alternativa ao FGTS
Pela proposta, além de ativos da União, a empresa poderá adquirir bens e direitos dos estados e dos municípios, além de poder participar de fundos de investimentos. Poderá também adquirir no mercado financeiro títulos de valores imobiliários e ofertar mecanismos que permitam a proteção de instituições financeiras a exposições de remuneração e prazo oriundos da concessão de crédito imobiliário. Assim, o governo vai usar a Emgea para a política de crédito imobiliário.
A Emgea poderá atuar como securitizadora (empresas que compram dívidas que os consumidores têm com outra companhia) e terá o estatuto alterado. As mudanças foram incluídas na minuta da medida provisória (MP) que institui o Programa de Redução da Pobreza, com medidas de acesso ao crédito para pequenos empreendedores.
Hoje não existe um mercado secundário de financiamento imobiliário porque há uma dificuldade de equalizar a TR e o IPCA. A TR é uma taxa financeira calculada a partir das taxas médias praticadas entre os investidores nas negociações de títulos públicos prefixados, que são as Letras do Tesouro Nacional (LTN).
Atualmente, não existe no mercado um instrumento financeiro (hedge) que permita a troca desses dois indexadores (TR por IPCA). A TR é aplicada basicamente na correção da Caderneta de Poupança, no FGTS e nos contratos habitacionais que utilizam esses dois fundings. Os demais agentes do mercado financeiro não utilizam este indexador, tendo muito mais afinidade com o IPCA.
Segundo técnicos a par das discussões, o estímulo ao mercado secundário seria criar uma fonte de recursos alternativa ao FGTS, mais focado no programa Minha Casa Minha Vida e à poupança, que tem dado sinais de que não conseguirá sustentar uma expansão do crédito imobiliário.
A liberação do compulsório da poupança ainda depende da aprovação do BC no Conselho Monetário Nacional (CMN), que reúne representantes da Fazenda e do Planejamento. O BC é que cuida das regras do compulsório.
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